LOC.: A capacidade de plataformas de inteligência artificial (IA) como o Chat GPT imitarem a criatividade humana levanta questões como: a quem se atribui o direito autoral e a propriedade intelectual de um conteúdo criado por inteligência artificial? Uma vez que esta ferramenta utiliza uma extensa base de dados já existentes para desenvolver determinado conteúdo, como seria a definição de autoria?
Frank Ned Santa Cruz, advogado e mestre em Gestão de Riscos e Inteligência Artificial da Universidade de Brasília (UnB), explica que a IA realiza milhares de cálculos utilizando bases de dados distintas para chegar ao desenvolvimento de uma obra, por exemplo. Portanto, segundo o especialista, não é possível apontar a quem pertence o direito autoral de uma determinada criação de IA, já que várias obras existentes foram utilizadas como referência. Em entrevista ao portal Brasil 61.com, Santa Cruz alerta, ainda, para a necessidade de o governo promover um “letramento digital” para que as pessoas não tenham seus espaços de trabalho ocupados por máquinas.
Qual a diferença entre propriedade intelectual e direito autoral?
TEC./SONORA: Frank Ned Santa Cruz, advogado e mestre em Gestão de Riscos e Inteligência Artificial da Universidade de Brasília (UnB)
“A propriedade intelectual protege a ideia, já direito autoral protege associação do criador à ideia. Uma coisa é desvinculada da outra. Propriedade intelectual, então, uma vez por meio de concessão de cessão, pode ser explorada comercialmente, mas não perde-se o vínculo do autor com a sua ideia. Nesse sentido, o direito autoral protege o vínculo do autor com a ideia.”
LOC.: É possível atribuir autoria de um conteúdo criado por inteligência artificial?
TEC./SONORA: Frank Ned Santa Cruz, advogado e mestre em Gestão de Riscos e Inteligência Artificial da Universidade de Brasília (UnB)
“Atualmente, não é possível fazer atribuição de autoria a uma inteligência artificial. Por outro lado, nós percebemos atualmente uma grande evolução dessas técnicas. Nós temos atualmente uma grande capacidade de processamento, uma grande quantidade de dados. Dados esses cada vez mais estruturados e quando você une esses elementos, você tem uma equação que permite então algoritmos que realizam resultados bastante interessantes e impressionantes, que dão uma percepção de criação como se fosse uma mente humana. Entretanto, quando se fala em mente humana, nós falamos de uma coisa chamada ideação mental. E atualmente esses algoritmos não possuem ainda ideação mental. Isso não quer dizer que no futuro isso não possa vir a acontecer, mas não é a realidade atual.”
LOC.: A inteligência artificial, como o Chat GPT, se baseia em obras já disponíveis na rede para criar um conteúdo. Nesse contexto, seria possível atribuir direito autoral ao criador da obra utilizada como base?
TEC./SONORA: Frank Ned Santa Cruz, advogado e mestre em Gestão de Riscos e Inteligência Artificial da Universidade de Brasília (UnB)
“Quando nós falamos de algoritmos que utilizam técnicas de machine learning e, dentro dela, deep learning, eles são treinados a partir de base de dados. Entretanto, as redes neurais artificiais realizam centenas ou milhares de cálculos. Então veja que necessariamente ela não é pautada em uma única base de dados, mas em um conjunto de base de dados. Da mesma forma, a mente humana, a mente criativa, mesmo quando ela produz uma nova obra, uma nova arte, ela não faz isso, necessariamente, a partir de uma única referência. Ela utiliza um complexo de referências.”
LOC.: Quais pontos positivos e negativos da IA?
TEC./SONORA: Frank Ned Santa Cruz, advogado e mestre em Gestão de Riscos e Inteligência Artificial da Universidade de Brasília (UnB)
“A inteligência artificial tem uma infinidade de pontos positivos a partir do momento que utilizada para aumentar a prontidão ao risco. Por exemplo, podemos ter, e já temos, algoritmos que conseguem detectar com mais precisão que especialistas humanos, por exemplo, padrões de câncer de pele, de micro tumores cerebrais, onde o algoritmo que trata com padrões a partir de uma formação, uma preparação, baseada em milhares ou milhões de ressonâncias magnéticas, ele tem uma acurácia muito maior que a do ser humano. Por outro lado, os algoritmos cada vez mais, a inteligência artificial dominando, por meio de técnicas computacionais e matemáticas, esses espaços de reflexão, de aprendizagem, ela pode sim, e já vem acontecendo, colocar em risco a colocação no mercado de profissionais. Até então retirava-se o emprego de pessoas não qualificadas, agora ela traz uma ameaça concreta também a profissionais qualificados.”
LOC.: O que precisa ser feito para que a IA seja uma aliada e não uma substituta do ser humano no mercado de trabalho?
TEC./SONORA: Frank Ned Santa Cruz, advogado e mestre em Gestão de Riscos e Inteligência Artificial da Universidade de Brasília (UnB)
“Podemos citar que, primeiro, precisamos acelerar o letramento digital para então as pessoas aprenderem a utilizar esses componentes de formas complementares a sua atuação profissional. Por outro lado, existe esse grande risco de os algoritmos de IA ocuparem um espaço que, até então, é um espaço unicamente humano, que é o espaço da criatividade. O risco já é estudado e mapeado, um conceito chamado de pós-humanidade. Então, enquanto sociedade e governo, eu penso que a primeira grande medida é o Estado instrumentalizar a sociedade por meio de campanhas, curso de formação, centro de pesquisa para acelerar o letramento digital.”
LOC.: Nós entrevistamos o advogado e mestre em Gestão de Riscos e Inteligência Artificial da Universidade de Brasília. Ele explicou que a Inteligência Artificial utiliza milhares de cálculos por meio de bases de dados distintas para desenvolver determinado conteúdo, o que inviabiliza apontar direito autoral desta criação. Santa Cruz também defendeu um letramento digital para capacitar a população para utilizar as novas tecnologias e não ser substituída por elas.
Reportagem, Fernando Alves