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Tarifaço: setores podem ter taxas de até 70%, diz CNI

Carnes, café e indústria química podem perder competitividade com tarifas adicionais consideradas proibitivas. CNI defende ação diplomática urgente para proteger empregos e investimentos

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A decisão do governo dos Estados Unidos de impor tarifas adicionais sobre uma ampla gama de produtos brasileiros reacendeu o alerta no setor produtivo nacional. A medida, que começa a valer em 6 de agosto, impõe alíquotas de até 40% sobre boa parte das exportações — em alguns casos, somadas a uma tarifa de 10% já vigente desde abril. O impacto é especialmente preocupante para setores como carnes, café, frutas secas, máquinas e equipamentos e produtos químicos, que já enfrentam desafios de competitividade internacional.

Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o cenário ameaça o fluxo de exportações para um dos principais parceiros comerciais do Brasil, colocando em risco cadeias produtivas integradas, empregos e investimentos bilaterais. Em entrevista, a gerente de Comércio e Integração Internacional da entidade, Constanza Negri, avaliou que, apesar de exceções pontuais na nova política tarifária, mais da metade das exportações brasileiras aos Estados Unidos ainda será afetada pelas alíquotas elevadas.

“Mais de 50% das nossas exportações seguirão sujeitas às novas tarifas. No caso do setor de proteínas, por exemplo, a alíquota pode ultrapassar 70%, o que é praticamente proibitivo. Estamos falando de um impacto direto em setores fundamentais como carnes, café e frutas secas, que devem ser prioridade nas negociações entre os governos”, afirma Constanza.

A especialista lembra que o setor de máquinas e equipamentos, relevante na pauta industrial brasileira com os EUA, teve parte dos produtos isentados, mas com uma limitação significativa: a isenção só vale para equipamentos destinados à aviação civil.

Perdas bilionárias e risco para o PIB

Estudo citado por Constanza e conduzido por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) projeta que um cenário generalizado de aumento tarifário — como o que começa a se consolidar — pode provocar perdas de até R$ 20 bilhões no PIB brasileiro, além de impactar diretamente cerca de 70 mil empregos, sendo 30 mil na indústria e 40 mil no agronegócio.

“Mesmo com as exceções anunciadas, esse estudo dá um norte do tamanho do prejuízo. O mercado americano é o principal destino das exportações industriais brasileiras. Cada bilhão de dólares exportado para lá gera, em média, 24 mil empregos diretos no Brasil”, ressalta a gerente da CNI.

Indústria química: impacto imediato e risco à parceria histórica

Entre os setores mais atingidos pela nova rodada tarifária está a indústria química, que vê ameaçada uma relação de décadas com os Estados Unidos. Segundo a Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), os EUA aplicaram uma tarifa adicional de 40% sobre a maioria dos produtos químicos brasileiros, o que, somado à alíquota de abril, resulta numa carga tarifária de 50%.

O impacto é direto sobre US$ 1,7 bilhão em exportações, que representam cerca de 70% do total vendido pelo setor químico brasileiro aos EUA em 2024. Apenas cinco produtos, entre 50 itens principais, ficaram isentos da nova tarifa. Éder da Silva, gerente de Comércio Exterior da Abiquim, explica que Brasil e Estados Unidos mantêm uma relação estratégica de investimentos, baseada em uma forte integração produtiva.

“Por isso, a Abiquim espera a ampliação da lista de exclusões, com o objetivo de mitigar tanto os impactos diretos quanto os indiretos — especialmente sobre produtos químicos adquiridos no Brasil para o processamento industrial de bens de diversas cadeias produtivas que também exportam para os Estados Unidos, como móveis, têxteis, couros e borracha.”

Além das exportações diretas, a associação já identificou efeitos indiretos em setores dependentes de insumos químicos, como móveis, têxteis e artefatos de borracha, que começaram a sofrer cancelamentos de pedidos de compradores norte-americanos.

Caminhos possíveis e articulação diplomática

A CNI e a Abiquim vêm atuando junto ao governo brasileiro para buscar soluções por meio do diálogo diplomático. Constanza afirma que a entidade seguirá subsidiando as autoridades brasileiras com dados técnicos e apoio aos setores afetados, atuando também como interlocutora com o setor privado americano.

“Sem dúvida, a nossa grande preocupação é em relação aos efeitos negativos na economia brasileira e continuaremos colocando esforços, como CNI, como indústria brasileira, juntos aos setores e às empresas para ser um facilitador junto ao governo americano e ao governo brasileiro e as nossas contrapartes para demonstrar o quão injustificada é essa medida em relação ao Brasil”, reforça a gerente da CNI.

A Abiquim, por sua vez, propõe medidas emergenciais, como a ampliação do Reintegra para 7%, devolução imediata de créditos de ICMS e novas linhas de financiamento à exportação, além de ações conjuntas com a entidade americana do setor, o American Chemistry Council (ACC), para reverter os efeitos das tarifas.

Diálogo como saída

A expectativa das entidades é de que as negociações avancem com base em critérios técnicos e econômicos, e não em decisões unilaterais ou geopolíticas. Para a indústria brasileira, a prioridade no momento é preservar o acesso ao mercado americano em condições justas e evitar retrocessos em uma relação comercial construída ao longo de décadas.

“Não podemos permitir que medidas como essa comprometam os avanços já conquistados. O momento é de união entre governo, indústria e parceiros internacionais para proteger empregos, investimentos e a competitividade do Brasil no cenário global”, conclui Constanza.
 

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